segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Como melhorar de fato a Saúde Pública no Brasil


O modelo atual de prestação de serviços de saúde, apesar de toda a evolução do Sistema Único de Saúde - o SUS, ainda é ineficiente e não cumpre o desiderato apontado na Constituição, de que é dever do Estado oferecer ao cidadão todos os meios para que ele goze de boa saúde. Ao contrário, o modêlo continua sendo alvo de críticas e, historicamente, se mostra como um sistema que oferece serviços de baixa qualidade à população e remunera mal os profissionais da rede pública de atendimento. As verbas federais repassadas aos estados e municípios, continua insuficiente para bem atender a todos os programas do MS e as necessidades da população.
Enquanto não são de fato ventiladas as causas desse caos, continuarão a perdurar as filas nos hospitais e clínicas; continuarão exames, consultas e cirurgias a serem marcados com datas ridiculamente distantes (muitas vezes quando o paciente melhorou por conta própria ou morreu); continuará a persistir a insatisfação do usuário; continuarão a morrer cidadãos que necessitam de, por exemplo, hemodiálise, que não conseguem agendar seu procedimento por falta de equipamento e espaço; continuará o sucateamento e todos demais itens da enorme lista de problemas da asistência à saúde pública no Brasil.
E quais as causas reais dessa situação?
Apesar de muitas propostas de solução para a questão da assistência à saúde pública, nenhuma delas tem se mostrado eficaz, pois elas carecem do elemento essencial, que não é comumente verificado nas discussões:
Temos um sistema de assistência e uma política de saúde inadequados à realidade social, cultural e econômica brasileira.
No Brasil o Governo investe muito no setor terciário (tecnologia de ponta, equipamentos caros, hospitais, etc.) e pouquíssimo, quase nada, no setor primário de saúde.
O setor primário em saúde é aquele em que se valoriza o aspecto cultural da população, identificada com seus princípios, valores, recursos naturais e humanos, além de outros elementos, utilizando-se pessoas e profissionais como agentes de saúde para atuar dentro das comunidades, capacitados, assistidos por profissionais de maior formação técnica, dentro de um modêlo multiprofissional e multidisciplinar de atenção à saúde. Foi o foco e o investimento no setor primário de saúde que produziu uma verdadeira revolução na situação de saúde da China, Índia, Cuba e diversos outros países, incluindo a re-incorporação da medicina tradicional.
O sistema e a política de saúde no Brasil é por demais centralizado no médico (dito “iatrocêntrico”) e, portanto, fundamentado no princípio de combate às doenças (que é aquilo para o qual o médico é treinado). O resultado é que a terapêutica centrada na medicação, na cirurgia ou ambos.
As verbas repassadas pelo Governo Federal aos estados e municípios para a saúde, não são suficientes para atender a todas os programas e as necessidades da população, resultando numa situação caótica, onde a chamada “municipalização da saúde”, como reza a política de saúde atual do SUS, torna-se impossível.
Numa linguagem simples, fugindo do “sanitarês”, para todos entenderem:
No atual modelo cidadão procura o serviço de saúde quando tem algum problema. Geralmente quando chega a um serviço, a sua doença já está adiantada ou é irrecuperável, o que, certamente, onerará os cofres públicos. O caso do diabetes é típico, pois quando se procura o médico, a doença já está em estágios ulteriores. Por isso o modelo atual é caro, oneroso e voraz, pois quanto mais cresce a população, avolumam-se os problemas, devido ao crescimento da demanda.
Na atenção primária na saúde - a exemplo do que aconteceu em diversos países, como a China, a Índia, e Cuba – não é o cidadão quem procura o serviço, mas o inverso: o serviço procura o cidadão, através da visitação domiciliar, seja do agente comunitário de saúde (elemento chave no processo), do médico, da equipe multiprofissional, etc., que atuam em postos avançados de saúde, preferencialmente dentro da comunidade. Desse modo, muitas doenças que estão em desenvolvimento, sem apresentar ainda sinais e sintomas, podem ser detectadas e tratadas, as mesmas que, mais tarde, estariam exigindo internação, tratamentos caros, etc., consubstanciando as diretrizes da melhor das medicinas, que é a verdadeira medicina preventiva. Além disso, cada cidadão ou família recebe orientação preventiva, remédios, vacinas, orientação de higiene e alimentação, etc. de modo a evitar as doenças, melhorando a qualidade de vida. Com isso, têm-se condição de conhecer a situação de saúde da população de modo quase personalizado (como o que ocorreu na China), onde relatórios rotineiros apresentam a real condição da população.
Com isto diminui-se drasticamente a procura às clínicas e hospitais, o que repercute na economia com as ações de saúde. Desde que esta inversão de modelo e política se faça com a atuação conjunta de uma equipe multiprofissional, consegue-se realizar aquilo que representa a chave que abre a porta para a revolução no sistema de saúde no Brasil - compreendido por poucos - que é a “desmedicalização” das ações de saúde, ou seja, reduzir a carga sobre os médicos dessas ações e distribuir essa carga e a responsabilidade para outros profissionais da área da saúde ou correlatos.
Esta é a recomendação da Organização Mundial de Saúde que, desde 1984, vem divulgando as diretrizes da Medicina Tradicional e estimulando os países membros a aplicar em seus sistema s de saúde a ideia de valorizar e utilizar os recursos humanos e naturais. Com base nessa filosofia, o nosso Ministério da Saúde lançou em 2006 a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares de Saúde, com a publicação posterior das Portarias 971 e 853, que instituem recursos como a Fitoterapia, a Acupuntura, a Homeopatia e vários elementos da Medicina Tradicional na rede pública de saúde, o SUS, em todo o território nacional. Isso representou um grande passo em direção a uma mudança ou evolução na oferta dos serviços, mas essas portarias não estão regulamentadas e não estão sendo postas em prática, a não ser em alguns municípios, porém de modo insipiente. É necessário capacitar profissionais de saúde – preferencialmente agentes comunitários de saúde e terapeutas naturistas - para assumirem o desiderato apontado nessas portarias.
O Ministério da Saúde criou o PSF - Programa de Saúde da Família, que está sendo aplicado em muitos estados e municípios, porém ele carece de estrutura e de base, estando ainda centrado demais no médico. Esse programa é importante e pode representar o ponto de partida para as mudanças necessárias na política de saúde aqui apontadas, desde que apropriadamente utilizado e adaptado.
Realidade:
O Brasil é o país de maior biodiversidade do mundo e o mais rico em plantas medicinais e recursos terapêuticos naturais, além dos recursos humanos culturais tradicionais como raizeiros, parteiras, curandeiros, pajés, na mais exuberante etnomedicina conhecida. No entanto, é o terceiro maior consumidor mundial de medicamentos e o país que paga pior os profissionais da área.
Precisamos de recursos mais baratos, mais simples e eficazes, com as plantas medicinais e outros recursos naturais, que não onerem a economia familiar, do cidadão ou do próprio governo. Os fármacos - apesar de necessários em muitos casos, principalmente agudos – são extremamente caros e não curam as doenças de fato. Há recursos integrativos e complementares mais simples como as ervas medicinais (muitas já catalogadas e aprovadas pelo Ministério da Saúde) a terapia pelos alimentos e recursos naturais, aos quais o povo brasileiro está culturalmente identificado e adaptado.
[Dr. Marcio Bontempo - Médico Sanitarista]

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